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domingo, 20 de dezembro de 2009

Relato sobre encontro com artistas do 1º Salão Universitário/Prêmio Espaço Piloto de Arte Contemporânea

Este mês abdicamos de uma entrevista formal, de praxe no blog, para realizar um encontro com alguns dos participantes do 1º Salão Universitário da UnB. Trazemos a seguir, então, apenas alguns ecos de uma conversa informal proposta por nossa equipe e algumas reflexões que ela possibilitou. Agradecemos a presteza e participação dos presentes no encontro.


Encontro do DNB com alguns dos participantes


do 1º Salão de Artes da UnB.


No dia 1/12/2009 a equipe DNB realizou um encontro com parte dos artistas selecionados para o 1º Salão Universitário/ Prêmio Espaço Piloto de Arte Contemporânea que aconteceu no período de 16 a 30 de novembro e teve o júri composto por Elder Rocha, Grace de Freitas e Nivalda Assumpção.


Nosso encontro aconteceu no ateliê de um dos artistas participantes, Fábio Baroli, e contou com a presença de alguns dos selecionados, a maioria dos quais apresentou seus trabalhos pela primeira vez.

Nomes: Alice Lara, Camila Soato, Carolina Barmell, Fábio Baroli, Felipe Olalquiaga, Gabriela Starling, Laurem Crossetti, Lucy Aguirre, Luiza Mader, Sang Min Bae.


Idade: entre 20 e 32 anos
Em Brasília devemos ficar atentos a obra de : Jean Matos (http://www.flickr.com/photos/jeemas)


Pintura como rasura


A pintura tem sido amplamente discutida e produzida nas dependências da Universidade de Brasília. Não é de se espantar que um número considerável dos artistas selecionados para o primeiro Salão Universitário da UnB sejam pintores. Não apenas pintores, mas pintores figurativos que tem como ponto de partida a imagem fotográfica (em especial em suportes virtuais; imagens obtidas na internet, registradas em celulares, etc.). As influências oscilam entre Lucian Freud, Luc Tuymans e a ironia corrosiva da pintura pop. Essa ironia ganha contornos nas inusitadas cenas de rinha de Alice Lara (uma das felizes surpresas da mostra), em uma certa sensualidade nula em Fábio Baroli, cruel comicidade de Camila Soato, e na altivez kitsh de Sang Min Bae.

Sang Min Bae
O único calouro a participar da mostra é bastante direto e franco quanto a seu desejo de profissionalizar-se como retratista. Essa intenção levou Sang a freqüentar em seu primeiro semestre de curso (precocemente para o fluxo do curso) os ateliês de pintura da UnB, o que resultou nas obras expostas. Podemos dizer que a pintura do artista tem uma desconcertante seriedade despretensiosa; Sang abdica da grandiloqüência, virtuosismos ou afetações pictóricas em favor do retrato deliberadamente direto enquanto flerta com as estratégias kitsh e elementos da história da pintura (o retrato com folha de ouro remete-nos inevitavelmente ao ícone e a imagem sacra). O resultado é uma pintura altiva mediante uma perícia e refinamento rústico.

Alice Lara


Fotografia: Lucy Aguirre


Alice Lara, diplomanda do curso de graduação, participa do salão (que considera efetivamente sua primeira exposição) com três pinturas à óleo que apresentam imagens de cachorros interagindo em posições de embate. As cores quentes e o tratamento que tende ao inacabado conferem uma vibração a essas imagens que potencializam a própria temática a que se propõe. Segundo a artista, as pinturas fazem parte de uma série realizada durante o curso baseada na percepção dos sentimentos expressos pelos animais e sua relação com os sentimentos humanos. Uma de suas principais influências imagéticas é o filme Amores Brutos (Amores Perros, Dir: Alejandro González. Argentina, 2000), além de utilizar-se também de imagens de rinhas pesquisadas na internet para as composições, o que termina por conferir a seu trabalho uma perturbadora dimensão de agressividade e libido, que nos remete a intrigante (e aflitiva) obra do ucraniano Oleg Kulik.

Fábio Baroli



Fotografia: Lucy Aguirre

Fábio Baroli iniciou sua fala contando parte de seu percurso ao longo do curso de graduação. Também diplomando do curso de artes, vem investindo na pintura a óleo com temáticas essencialmente figurativas. Os trabalhos expostos no salão fazem parte da série Narrativas Privadas desenvolvida ao longo deste ano. Segundo Fábio, essa série adquiriu uma escala reduzida em relação a suas produções anteriores, entretanto, o espaço interno da cena representada expandiu-se. Se antes sua temática era voltada para o retrato, agora seu interesse direciona-se para a representação de cenas seqüenciais (trípiticos ou polípticos) que apresentam figuras em situações íntimas. A composição estrutura-se a partir de um olhar externo que, muitas vezes, acaba por inclui a própria janela relacionando a posição do observador à do voyeur.

Camila Soato


Fotografia: Lucy Aguirre


Há uma certa tragicidade cômica na obra de Camila Soato. A artista debruça-se sobre a ironia e o grotesco, uma investigação que a conduziu da careta (como a sarcástica e jocosa contração e distorção da fisionomia) àquilo que ela hoje define como situações cômicas. O tratamento e o teor das cenas sugerem uma espécie de degradação, de certa forma como espasmos pictóricos (talvez uma gargalhada incontida e um tanto perturbadora) que configura um universo irônico e cruel. A ênfase aqui é na mudança de escala, fruto do desenvolvimento da série no contexto acadêmico.

Opacidades e fantasmagorias do olhar
De Julia Kristeva a Yves-Allain Bois, de Did-Huberman a Evgen Bavcar, o discurso contemporâneo da arte parece alicerçado naquilo que, mediado pelo olhar, põe-se em perda. A in-visão, o olhar turvo, o perder de vista, o ver só-depois. A tempo, a arte, parece-nos, constitui um desafio a nossa visão e uma solicitação a nosso olhar; os obstáculos são muitos e produzem seus phantasmas (caso de Felipe Olalquiaga e Laurem Cosseti) ou convidam-nos a opacidade (Lucy Aguirre e Luiza Mader). Paixão pelo olho de vidro; fecha os olhos e vê...

Lucy Aguirre


Fotografia: Lucy Aguirre


Lucy Aguirre apresenta instrumentos ópticos que revelam-se como empecilhos ao olhar. Junto a um par de máscaras e lunetas/caleidoscópios, um conjunto de fotografias da artista manipulando os objetos transforma-se em instruções/convite ao uso. Há um espelho disposto em meio ao conjunto, para que o público possa, através da turvidão dos obstáculos visuais divertir-se com a inusitada intervenção fisionômica. A dimensão lúdica da obra é um dos motes da artista como essencial a sua elaboração poética. Há uma diferença crucial entre os instrumentos que supomos aparatos ópticos e as máscaras: pelo simples fato de que as máscaras não são feitas para ver, mas para ser visto (e talvez por isso esses objetos tenham uma certa vocação ao espelho e ao reflexo). A máscara atua como uma venda, que nos remete ao jogo de identidade/ alteridade (e, talvez de intimidade). Já os utensílios (inutensílios, como diria Manoel de Barros), que supostamente atuariam como espécies de próteses que aguçam a visão ou que revelam imagens, produzem um jogo de expectativas; despertam o desejo de ver e incitam uma certa captura do olhar; a subversão dos objetos se confunde com a própria subversão do olhar... somos convidados a des-ver e aprofundarmo-nos em nossa condição de videntes.

Felipe Olalquiaga


Felipe Olalquiaga recusa qualquer tipo de discurso acerca de sua obra. Seu processo se daria em outra ordem, alheio as demandas de um embasamento teórico prévio. Propõe-se, assim, os elementos de uma abiogênese poética; a obra ofertada como uma aparição. No díptico fotográfico, registra-se um vulto que parece fazer eco as fotografias de Sybell Corbett ou aquelas phanto-grafias tão comuns na segunda metade do séc.XIX e início do XX. O objeto – o corpo ansioso que a câmera lê como espectral - em eminente fusão com o fundo estampado, gera a expectativa da des-aparição. Fotografar é, por fim, despedir-se do objeto.


Luiza Mader

Fotografia: Lucy Aguirre


Talvez mais do que qualquer um dos presentes, as questões de Luiza Mader são marcadamente processuais. Sua pesquisa, que transita com certa desenvoltura entre a pintura e a encáustica, resulta em uma superfície que expande o campo pictórico e sugere uma relação tátil, incitando uma aspereza própria ao olhar. Somos aludidos a uma estratigrafia, um sobreposição de substâncias e processos que revela a própria fatura da obra enquanto a omite furtivamente, que a evidencia e veda em uma espécie de aterramento.

Memórias, remorsos e nostalgias

Segundo Alberto Manguel, todo conhecimento não passa de uma recordação; e isso nos basta. A imagem, quantas outras imagens oculta? E, por vezes, é necessário apenas o ímpeto memorioso para que tantas outras se desvendem. O olhar parece então configurar um modo de desempenhar a nossa nostalgia no mundo. A herança, o passado, a memória, essas parecem configurar a tônica dominante nas obras de Laurem Crossetti, Carolina Barmell e Gabriela Starling.

Laurem Crossetti




Fotografia: Lucy Aguirre


A vida tem seus bastidores... Mas, quem se atreve a prosseguir? O discernimento constrange. Os versos de Laurem Crosseti (como inversões ou subversões do discurso fotográfico) parecem abdicar desse ímpeto memorioso. Alí, aonde as coisas se afirmam por suas ausências, acaba a minha nostalgia e começa a nostalgia do papel. No verso da fotografia reside uma outra memória, que talvez constitua já memória alguma. A mera inversão do suporte fotográfico torna-se a negação da imagem, abre espaço para o antirretrato.
Estrofe de prata, o rosto sorridente e desbotado, a família austera e digna, as férias empoeiradas e o bolor dos outros dias: o espetáculo nos é negado, é omisso. O verso é opaco, é áspero, e inaugura em mim a turvidão de uma anamnese sépia. A dedicatória é uma caligrafia triste... o verso é apenas uma versão.

Carolina Barmell

Fotografia: Carolina Barmell


A memória pode produzir cartografias bastante singulares e inusitadas. A pintura faz da memória composição, a fotografia faz da memória corte e enquadramento, o cinema faz da memória montagem. O viajante lembra; é um memorioso por vocação. Sua memória não cabe em seu território e, por vezes, reconhece locais longínquos.: Inconfessável déjà vu do andarilho de terras alheias.
O olhar lusitano é necessariamente nostálgico (os lusófonos tem o monopólio da saudade). Em meio a sua viagem por Lisboa e Sintra, Barmell apresenta-nos esses fragmentos de paisagens em sucessão de tamanhos (memórias em diferentes dimensões) em insistente repetição, como uma espécie de jogo cujas regras não são claras, ou como alguém que descobre-se herdeiro de uma coleção da imagens ancestrais.

Gabriela Starling




Fotografia: Gabriela Starling


Diz Goethe: “Aquilo que herdaste de teus pais, conquista-o para fazê-lo seu". Gabriela Starling lança-se em uma série de desenhos referentes a um clássico da literatura mundial: Fausto de Goethe. Na verdade, Fausto faz referência a uma lenda popular alemã, a se saber, a história de um pacto. Dentre as diversas adaptações da célebre narrativa, somos inevitavelmente remetidos a inesquecível cena cinematográfica em que a peste é representada como uma virulenta projeção da sombra do diabo que se abate sobre uma cidade. Mefistófeles é um ser perigoso e traiçoeiro; um ser mágico e pernicioso. No entanto, Mefistófeles de Starling é uma criatura um tanto engraçada (talvez desengonçada); com sua asa partida, seu coração a mostra, seu ventre listrado, o falo rasurado e seus olhos em cruz. Sobre ele, três estrelas furtivas, talvez a fulgura negra da noite, talvez a marca de sua ascendência nobre.
Starling brinca como um Cristoph Haizmann pueril. A transparência e o cintilar seduzem, por que o olhar pueril é facilmente capturado; porque é, desde o princípio, entregue ao fascínio. Talvez, em alguns aspectos, esses personagens estáticos de Starling constituam uma alternativa àqueles retratos de Bae, ou uma versão perversamente infantil do voyeurismo de Baroli. De todo modo, são criaturas precárias em suportes precários, são apropriações lúdicas e desenvoltas, daquele que brinca um tesouro herdado, que o conquista no jogo e que, por fim, faz dele sua riqueza.

9 comentários:

Fábio Baroli disse...

Adorei!

Parabéns à equipe!

André disse...

Adorei tb!

barmellbar disse...

.acho que fui bem recompensada pelas obras e agora por esse testículo lindo!
.na confusão das minhas palavras entendeu tudinho!
beijo,

ArrozcomGranola disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
blerg disse...

cara to com medo do oleg kulik, nao conhecia e to com medo! rs

poxa me sinto privilegiada pelo texto de vocês, e os outros tambem estao muito legais! muito bom participar!

Marcelo disse...

texto bonito porem com um pedantismo desnecessario. a arte é pra ser pedante afinal? ela precisa de texto? texto chato para a rodinha da arte? eu gosto das coisas simples, bonitas e vcs!?! :P

Laurem disse...

achei o texto muito legal. adorei!
e pedante e' quem me diz, hahah.

saudades, povo. beijao!

Matias Monteiro disse...

Marcelo,

Buscamos ser bastante criteriosos na formulação do texto e faremos o mesmo com suas indagações:


“texto bonito” – Obrigado. A equipe agradece.

“Pedantismo desnecessário” - Não tínhamos intenção de produzir um texto pedante ou chato; Nossa intenção era a de elaborar uma reflexão com seriedade, dedicação e comprometimento que julgamos compatíveis com o respeito que temos por cada um dos artistas que nos confiaram seus processos e questões. De fato, tampouco nos pautamos pela humildade e didatismo...

“A arte é para ser pedante afinal?”- Não, não é para ser... mas pode ser.

“Ela precisa de texto?”- Não, mas precisa de discurso e de reflexão. Por vezes isso culmina na realização de um texto. É necessário a qualquer área do conhecimento que ela seja debatida, questionada, divulgada, pesquisada, etc.

“texto chato para rodinha da arte?” – O ideal são textos instigantes e bem embasados para o maior número de pessoas interessadas no assunto. Um dia a gente chega lá...

“eu gosto das coisas simples, bonitas e vcs !?!” – Eu gosto das coisas complexas e bonitas (as vezes nem tão bonitas assim)... bom, mas como você disse que o nosso texto é ao menos bonito, estamos no bom caminho... ficamos devendo a simplicidade para a próxima.

Mas eu devo dizer que percebo um pedantismo também na forma que você apresenta suas críticas. Se você acha que existe um modo equivocada de produzir, divulgar ou refletir sobre a arte, por favor, abra um espaço para dar vazão a suas propostas, nos mande e nós o divulgaremos aqui. Brasília está carente de espaços de reflexão, e quanto mais, melhor. Nós estamos conduzindo o nosso da forma que nos parece mais apropriada.

Busquemos mais diálogos (o que é saudável e urgente) e menos ataques e confrontos inócuos... digo isso sem nenhum pedantismo, apenas com muita sinceridade.

Aproveitamos para agradecer novamente aos participantes do encontro e reafirmar que nosso texto teve prioritariamente a intenção de divulgar e contribuir para o desenvolvimento das pesquisas de vocês. Fomos lentos para postar porque procuramos ser sérios e criteriosos. Pretensão, apenas a de não trair a confiança de vocês.

Abraços a todos e feliz natal.

Jean Matos disse...

Fiquei MUITO feliz com o que vi neste 1º Salão Universitário de Arte Contemporânea, acredito que foi algo que demorou pra acontecer, mas finalmente aconteceu e deu início, acredito, a uma nova fase no curso de artes plásticas da UnB.

Sinto por não ter participado, pois vi o quanto foi contagiante e apaixonante todo o processo. Todos os artistas participando na montagem, ajudando uns aos outros com todo cuidado que se pode ter.

Muito obrigado pela indicação! Prometo que no próximo vou dar o meu melhor e concretizar meus projetos! :)

Parabéns a todos!

Jean Matos